Hoje, vou contar-vos a história da minha filha Luísa. E de como aos 6 anos escolheu este almoço para passeio, que me encheu de orgulho.

Era uma vez uma menina, que não queria comer. Como todas as crianças, passou por várias fases na sua infância em que não queria comer.

Primeiro na introdução da alimentação complementar, sempre com desconfiança no que lhe estávamos a enfiar na boca. Umas vezes cerrava os lábios e não havia colher que ali entrasse. Mas estava bem, era feliz, activa e sorridente, estava bem. Odiava maçãs, de todas as formas. Hoje, 6 anos depois, é a fruta preferida. Come com casca, sem casa, partida, inteira. Chega a comer 3 maçãs por dia, escondendo à mãe, que havia comido maçã ao almoço e roubado outra da cesta de frutas da cantina ao lanche. 

Depois, veio a anorexia fisiológica do segundo de vida. Passava dias só com o leite da manhã na barriga, às vezes com mais 3 colheres de sopa do almoço. Tempos duros para esta mãe, que ansiava para que a sua bebé comesse alguma coisa, qualquer coisa. Mas estava bem, era feliz, activa e sorridente, estava bem. Nesta altura encostava tudo o que era verde do prato, cuspia pedacinhos de brócolos ou feijão-verde da sopa. Hoje uma das suas sopas preferida é precisamente a de feijão-verde.

E pensamos “já chega, basta, chega de comer mal”. Mas não. Com 2 anos passou a falar, a comunicar, a dizer que não e a rejeitar. Num dia adorava tangerinas, no seguinte dizia que não. E isto acontecia com todos os alimentos, à vez, ou todos ao mesmo tempo. E isto durou, e durou… Mas estava bem, era feliz, activa e sorridente, estava bem.

Até que um dia – não foi de repente, foi gradual, nem dei por ela – a menina, que não queria comer, passou a comer. Não comia muito, mas comia bem, no sentido que fazia boas escolhas e tinha boas preferências. Como fiz isto? Não sei ao certo. Tentei empatizar com ela, perceber o que gostava, o que gostava menos, como preferia os seus alimentos. Levei-a ao supermercado comigo, deixei-a escolher alimentos (algumas maçãs podres, uns espinafres murchos). Deixei-a explorar, conhecer e aprender. Respondi sempre a todas as suas perguntas, do que era, de onde vinha, porque era assim, a que sabia. Desafiei-a a provar. Um dia uma lambidela, no dia seguinte uma trinca cuspida. Trouxe-a para a cozinha e dei-lhe um descascador, uma faca, as mãos e a motivação. Preparamos muitas refeições juntas, deixo-a escolher combinações, provar e testar. 

Hoje, a menina, que não queria comer, teve um passeio da escola. Já me havia surpreendido há um ano com uma bela lancheira de almoço, mas esta foi mais especial ainda. Os passeios da escola, sobretudo aqueles que requerem lanche ou almoço, são especiais cá em casa. Dou-lhes a liberdade de pensarem e sugerirem o que querem levar. Sem grande pressão ou imposição, com tempo e antecedência, para que possa comprar e preparar tudo. Para hoje, a Luísa disse logo que queria: brócolos e cenouras cozidas (às vezes prefere cruas), alface e pepino. Pediu bolonhesa de lentilhas, mas expliquei que seria complicado de comer fora de casa. Fiz algumas sugestões, croquetes da avó, omelete, nuggets de frango ou panadinhos de peixe, escolheu os últimos e ajudou a fazer. Ontem à noite já ficou com um vislumbre do que seria o seu almoço e estava satisfeita. Preparámos algumas framboesas para comer de sobremesa.

Hoje a menina, que não queria comer, foi para a escola e explicou o seu almoço a toda a gente por quem passou, muito orgulhosa de si. E eu tão, mas tão orgulhosa dela. Nunca duvidei que a bebé que odiava maçãs e rejeitava todos os alimentos, se viesse a tornar nesta menina, que sabe comer e o que comer. 

Por isso, mesmo que custe, que vos faça arrancar cabelos, que vos faça chorar e questionar o que estão a fazer de errado, assumam que é normal, que vai passar, e que um dia os vossos meninos e meninas, que não querem comer, vão vos pedir alface, pepino, cenouras e brócolos, para o almoço do passeio da escola.

 

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