Hoje deu-me para isto, porque é algo que me começa a aborrecer verdadeiramente e hoje tive mais um episódio destes. Não entendo qual o critério para definir coisas de meninas e coisas de meninos. Falo em brinquedos, vestuário, calçado, a sério que não entendo. 

Sempre eduquei as minhas filhas para que não fizessem este tipo de descriminação. Têm roupa da secção de menino, como têm roupa da secção de menina. Têm roupa. Ponto. Roupa que eu gosto e que comprei, não percebendo o porquê da descriminação. Têm bonecas e carros telecomandados, aqueles brinquedos tipicamente estereotipados. As minhas filhas viveram sempre sem esta descriminação, do que é de menina e do que é de menino. 

A primeira vez que lidei com isto, foi quando a minha filha mais velha disse na rua que um senhor de cabelo comprido tinha cabelo de menina. Perguntei porque ela dizia aquilo e ela respondeu que era o que diziam na escola. Expliquei que se ele era um menino e o cabelo era dele, então tinha cabelo de menino. Na altura eu usava o cabelo curto e perguntei o que ela achava do meu cabelo. Percebeu ali, de imediato, que homens e mulheres eram livres de usar o cabelo como queriam. 

Mais tarde, tivemos um problema com sapatos. A escola das minhas filhas tem regras específicas em relação aos sapatos (usam uniforme e os sapatos têm que ter determinadas características). Com o uso dos sapatos tive que comprar outro par a meio do ano e optei por sapatos de vela com velcro. Por serem fechados eram melhores para o inverno, a costura à frente oferecia maior resistência nas brincadeiras do recreio e o velcro era muito útil para calçar e descalçar rapidamente. A Luísa foi muito feliz para a escola com os seus sapatos novos. Chegou a casa muito triste e disse que não queria mais aqueles sapatos. Perguntei porquê e ela disse que as outras meninas disseram que os sapatos dela eram de menino!! Expliquei que não há sapatos de menino, nem sapatos de menina. Sapatos são sapatos e são usados por quem quiser. Reforcei que os sapatos dela eram bonitos, úteis e resistentes. Foi muito confiante para a escola e andou com esta resposta sempre na ponta da língua para tudo (já lá vão quase 2 anos).

No fim-de-semana fomos comprar óculos para a Luísa. Na loja ela pegou nuns óculos que lhe agradaram e o senhor disse muito rapidamente “mas esses são de menino!” (eram óculos dos Avengers com desenhos do Iron Man). A Luísa, que experimentava os óculos em frente ao espelho, virou-se muito lentamente, tipo cena de filme, e disse ajeitando os óculos no nariz “não há coisas de meninos, nem coisas de meninas, não sabias? As coisas são coisas e são para serem usadas por quem quiser.” O senhor encolheu-se, muito encolhidinho, olhou para mim e fez um sorriso tremido. Para completar a cena, a Luísa colocou os ditos óculos no monte dos preferidos (acabou por não levar esses no final).

Para terminar, a semana passada mandei vir sapatilhas de uma loja online. Sapatilhas brancas, simples, para as actividades desportivas das meninas. Sapatilhas o mais básico que possa existir. Quando coloquei no carrinho, apareceu na descrição “sapatilha de menino”. What? São sapatilhas brancas, normalíssimas, porque são “de menino”. Ignorei e mandei vir as ditas. Hoje fui levanta-las à loja, abro para ver se está tudo ok e qual não é o meu espanto quando dentro das sapatilhas está “marca-da-loja BOY”. Really? Mas porquê? E para quê?

Isto é desgastante, para mim, que tento sempre quebrar esta barreira do estereotipo, perante os meus filhos. E para as minhas filhas que têm que explicar dia-sim dia-também, a outras crianças e adultos, que as coisas são coisas, e são para serem usadas por quem quer como quiser. 

E sim, o Francisco usa bolsas à tira-colo, porque pede, e tiaras quando brincam de princesas. Para já o grande problema é só ter 2 tiaras para 3 crianças!